No governo Bolsonaro, o dia 31 de março era comemorado pelo Exército como a data da “revolução” e não de um golpe que teria dado início a ditadura militar no Brasil.
O assunto já vinha em discussão desde a posse de Luiz Inácio Lula da Silva, mas foi reforçada após os ataques de vândalos em Brasília no dia 8 de janeiro.
O martelo foi batido após a troca do general José Arruda pelo general Tomas Paiva no comando do Exército, e desde 2023 o Exército não comemora a efeméride da Revolução Democrática de 1964, e a decisão contou com o aval do ministro da Defesa, José Múcio.
Este ano o comandante do Exército, general Tomás Paiva, já determinou que não haverá ordem do dia em comemoração aos 60 anos do “golpe militar de 1964”. Segundo o comando da instituição a decisão é de praxe e foi tomada também no ano passado.
Mas a polêmica está longe de acabar já que no último dia 28 de fevereiro, Lula disse querer evitar “remoer o passado” com questões envolvendo os 60 anos do golpe militar de 1964 (SIC). O presidente afirmou, em entrevista na 3ª feira (27.fev), que os atos antidemocráticos de 8 de Janeiro causam mais preocupação que a lembrança da tomada de poder pelos militares.
Contra tensão com militares, Lula cancela ato sobre o golpe de 1964
Presidente pediu que a data seja tratada com “serenidade” pelos integrantes das Forças Armadas e pelos militantes de esquerda de seu governo.
Por isso, o presidente determinou o cancelamento, no âmbito do governo, de solenidades, discursos e produção de material oficial alusivo à efeméride, como revelou o site do Correio Brasiliense, na semana passada. A principal agenda nesse sentido está ligada ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, que cancelou alguns eventos.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) mandou o ministro de Direitos Humanos, Silvio Almeida, cancelar ato que relembraria os “perseguidos” do golpe militar de 1964 no Museu da República, em Brasília, em 31 de março.
A ordem do petista seria para evitar tensionar a relação com os militares e minimizar o destaque para data, que era celebrada pelo governo de Jair Bolsonaro (PL). Lula quer apaziguar as relações dos militares das Forças Armadas e seus apoiadores —que, em sua maioria, são críticos à presença dos fardados no governo.
À revelia do presidente Lula, entidades e parentes de vítimas da ditadura vão “descomemorar” os 60 anos do 31 de março
Porém segundo informações do Correio Brasiliense, à revelia da decisão do presidente Lula da Silva de vetar manifestações em tom crítico à ditadura, na lembrança dos 60 anos do golpe militar ou revolução democrática de março de 1964, entidades da sociedade civil, movimentos sociais e parentes de vítimas da ditadura e políticos, incluindo parlamentares do PT, preparam uma agenda extensa de atos para não deixar a data passar em branco.
Do lado das entidades, ao contrário, são várias as ações programadas. O Instituto Presidente João Goulart anuncia uma série de atos, como palestras, debates e, também, uma missa em memória aos opositores ao regime que foram mortos ou desapareceram pela ação de agentes do regime ditatorial. A Comissão Nacional da Verdade concluiu, em seu relatório final, que 434 pessoas morreram ou desapareceram nos chamados anos de chumbo.
“Equívoco” de Lula
Um dos organizadores da Marcha da Democracia, o deputado federal Reimont Santa Barbara (PT-RJ) classificou como um erro a decisão do presidente Lula de proibir atos oficiais que lembrem as violações cometidas pelos militares a partir de 1964.
“Acho um equívoco. Como parlamentar governista, sou do PT e defensor das políticas do governo, mas, com algumas coisas, não se pode tergiversar. Não dá para deixar passar em branco uma data tão importante como essa. É a descomemoração do golpe. A marcação da posição contrária ao que ocorreu. Temos uma Lei de Anistia que precisa ser revista, que não prevê a punição dos torturadores. Muitos deles já morreram, outros estão aqui. Não podemos ser condescendentes com eles. Portanto, acho um equívoco a postura do governo”, disse o Reimont ao Correio.
Para a Direita Não foi golpe! Veja os 12 fatos que levaram à revolução de 31 de março de 64
Revolução Democrática de 1964, o movimento que objetivou, acima de tudo, evitar que o Brasil fosse entregue nas mãos dos comunistas. É muito simples para qualquer pessoa, nos dias de hoje, levantar argumentos que contrariem os fundamentos nos quais se baseiam os regimes ditos socialistas/comunistas.
Com a queda do muro de Berlim em 1989, com a derrocada político-econômica-militar da ex-União Soviética e, em conseqüência, a realidade que surgiu das luzes lançadas nos porões dos governos comunistas é possível provar de forma sobeja e cristalina a contradição do regime dirigido por Moscou desde 1918 e imitado pela China e tantos outros países.
No entanto, se observarmos com atenção o passado recente do Brasil (1922-1964) e reagirmos aos fatos ocorridos com a conjuntura mundial correspondente, veremos que a Revolução Democrática de 1964 representou o clímax de um longo ciclo revolucionário que começou com a Revolução de 1922 (tenentismo) no Rio de Janeiro e terminou com aquela que é considerada “a revolução para acabar com todas as revoluções” (31 de Março de 64).
Após a 2ª Guerra Mundial, o mundo viu-se dividido em dois blocos antagônicos, vivendo o período denominado “Guerra Fria”. Até o fim da União Soviética em 1988, diversos países passaram por processo revolucionários que os levaram para esfera de influência daquele país e à adoção do sistema político-econômico comunista. Foi o caso de China, Cuba, Angola, Nicarágua, Vietnã e muitos outros.
Datas e fatos históricos
Neste contexto mundial, o Brasil viveu uma sequência de eventos políticos que levaram à ruptura institucional ocorrida em 31 de março de 1964, que este ano comemora 59 anos
- 1954 – Suicídio do Presidente Getúlio Vargas, acirrando antagonismos políticos;
- 1955 – Eleição de Juscelino Kubistchek, pelos partidos varguistas, o qual conseguiu trazer alguma estabilidade e avanços econômicos;
- 1960 – Eleição de Jânio Quadros, político populista, opositor de Juscelino, e tendo como vice o ex-líder sindicalista João Belchior Goulart, “Jango”;
- 1961- Renúncia de Jânio Quadros; grupos políticos e militares se opuseram à posse do vice-Presidente, o qual estava em visita à China Comunista no dia da renúncia;
- 1961 – Adoção temporária do parlamentarismo e posse de João Goulart; iniciou-se um processo de aparelhamento do Estado por elementos do ilegal Partido Comunista Brasileiro, de apoio a Jango; eclodiram manifestação e greves de cunho político em todo o país;
- 1962 – Em clima de agitação, Jango propôs em vários pronunciamentos a adoção de medidas políticas e econômicas que receberam o nome genérico de “reformas de base”, de natureza estatizante, e eram direcionadas para um sistema político-econômico característico do bloco soviético;
- Setembro de 1963 – um sindicato de Sargentos conduziu uma revolta armada em Brasília, chegando a cercar o Congresso Nacional. Depois de derrotados e presos, o Presidente Goulart anistiou os revoltosos, desautorizando os comandos militares;
- 13 de março de 1964 – um grande comício é organizado pelo ilegal Partido Comunista Brasileiro. O próprio Presidente comparece e faz um discurso prometendo para breve as “Reformas de Base”. Antes e depois do evento, o Presidente assinou decretos de desapropriação e encampação de refinarias e propriedades rurais;
- 19 de março de 1964 – grande manifestação popular, de inspiração religiosa, no Rio de Janeiro reúne mais de quinhentas mil pessoas, que pedem intervenção militar.
- 26 de março de 1964 – ocorreu uma revolta de marinheiros no Rio de Janeiro. Após a contenção do movimento, o Presidente anistiou os revoltosos, que desfilaram em desafio às autoridades da Marinha.
- 30 de março de 1964 – a Associação do Sargentos da Polícia Militar do Rio de Janeiro realizou uma reunião no salão do Automóvel Clube do Brasil. O Presidente compareceu e realizou um discurso em que radicalizou sua posição pela adoção imediata das “Reformas de Base”.
O apoio dado pela Rede Globo à revolução de 1964
Questionado por William Bonner sobre a atuação dos militares, em entrevista ao Jornal Nacional em 2018 o então candidato a presidência Jair Bolsonaro, citou um editorial de 7 de outubro de 1984, em que o presidente da Globo, Roberto Marinho, admitia o apoio ao golpe de 64. “Participamos da Revolução de 1964, identificados com os anseios nacionais de preservação das lnstituições democráticas, ameaçadas pela radicalização ideológica, greves, desordem social e corrupção generalizada”, diz o texto publicado 34 anos atrás.
No texto de 84, Marinho dizia ainda que “o caminho para o aperfeiçoamento das instituições é reto. Não admite desvios aéticos, nem afastamento do povo”.
Veja o texto do editorial de Roberto Marinho na íntegra clicando aqui
O dia 31 de março de 1964
O General Olímpio Mourão Filho iniciou um movimento de tropas em direção ao Rio de Janeiro, enquanto o Governador de Minas Gerais, José de Magalhães Pinto, divulgou um pronunciamento pelo rádio.
Logo ocorreu a adesão de todas as Forças Armadas e significativa parcela das lideranças políticas do país. Jango refugiou-se no Uruguai, e um novo ciclo político teve início. Em 02 de abril o Congresso Nacional declarou a vacância da presidência e, em 11 de abril, o mesmo Congresso elegeu o Marechal Humberto de Alencar Castello Branco como Presidente.