Mais de 150 anos depois das primeiras imigrações, colônia italiana na região mantém viva as tradições do país natal
Reduto de imigrantes italianos, Quiririm, distrito de Taubaté, é o grande símbolo da imigração, é a Itália no Vale. A localidade ainda hoje é morada de muitos descendentes dos primeiros italianos que ali plantaram raízes, disseminaram sua cultura e tiveram fundamental importância para o desenvolvimento do Vale do Paraíba.
Apesar de existirem outras cidades com concentrações de famílias italianas, Quiririm se destaca das demais abrigando o único museu de todo o Vale voltado às memórias dos imigrantes: o ‘Museu da Imigração Italiana’. O casarão, que abriga o museu, era de posse da família Indiani, que iniciou sua construção em 1897. Em 1985 o imóvel foi adquirido pela prefeitura e, desde 1997, tornou-se uma instituição cultural em homenagem à imigração. A cidade também promove a tradicional festa de Quiririm, que já teve 30 edições, como o evento destinado a difundir a cultura e culinária italiana.
Além dos marcos históricos, no distrito taubateano era evidente a vida em sociedade dos imigrantes, que, mesmo passados mais de 150 anos, são reconhecidos pela união dos que ali viviam. “Tudo indica que, para Quiririm, vieram muitas famílias de uma mesma região italiana, as quais já eram ligadas entre si na região de origem. Aqui elas acabaram se entrelaçando ainda mais’’, explicou Renata Eberhard, historiadora e membro da Società 30 di Aprile.
Em sequência, os imigrantes foram chegando a outras cidades do interior paulista. De acordo com a historiadora e educadora de língua e cultura italiana, Cesira Papera, os italianos vindos do sul, principalmente da Campânia e Calábria, procuravam por centros urbanos para viver. Em contrapartida, os provenientes da região norte, primordialmente do Vêneto e Lombardia, áreas rurais e férteis. Posteriormente, os italianos contribuíram com o desenvolvimento da região, diversificando suas atividades laborais.
“Parte do desenvolvimento das antigas cidades do Vale do Paraíba se deve à presença de imigrantes italianos e outros, pois sendo a sociedade de origem escravocrata, não existia a especialização e diversidade de serviços entre os brasileiros daquele período, foram os imigrantes que trouxeram e incentivaram as instalações comerciais e industriais’’, completou Cesira.
Ainda de acordo com a historiadora, a presença dos italianos acabou por incentivar o crescimento da região, fazendo com que o empreendedorismo criativo e a valorização dos esforços pela iniciativa privada levassem o Vale para outro patamar.
‘’Naquele momento de transição de uma sociedade escravocrata para uma sociedade livre, além da mão de obra e força de trabalho, o capital cultural, presente nas mentalidades dos imigrantes italianos, foi imprescindível, tendo um papel determinante para a formação de uma sociedade fundamentada na liberdade”, afirmou Cesira.
Outro fator importante se dá pelas características sociais presentes no cotidiano dos vale-paraibanos: a vida em sociedade. Os italianos procuram assegurar as características de sua cultura. O apelo religioso – mais precisamente o catolicismo -, comemoração de festas tradicionais, valorizam às origens étnicas e priorização da família em seu meio.
Além da preservação de hábitos de convivência social, é de origem italiana as receitas hoje presentes na mesa dos brasileiros, principalmente a apreciação culinária da massa e do vinho. Assim como várias canções, trazidas pelos imigrantes, que permanecem na memória e trazem consigo sua cultura e beleza próprias.
Domenico Trocino é italiano, nascido em Crotone, na região da Calábria, no sul da Itália e, desde 1994, vive no Brasil, mais precisamente em Jacareí. Formado em Artes e gastrônomo, Trocino acredita que a cultura italiana poderia ser melhor difundida por aqui. “Não vejo muita diferença, de uma forma geral, entre Jacareí e Taubaté… Quiririm. A única diferença entre elas é o número de eventos que cada cidade promove.”
Domenico também comenta que se sentiu acolhido no Brasil e se orgulha do afeto dedicado aos italianos como ele. “Fui sempre bem recebido. O brasileiro tem carinho especial com estrangeiros e creio que para o italiano a identificação é ainda maior’’, comemorou.
Ainda hoje, mesmo passados mais de 150 anos da chegada dos primeiros imigrantes, as cidades do Vale mantêm viva a memória dos italianos, aqueles que, por conta de sua vinda à nossa região, disseminaram sua cultura, hábitos e estilo de vida, deixando um legado e uma rica história para o Vale do Paraíba. ‘’São marcantes na cultura italiana, o forte apelo a proteção da família através do trabalho, da educação e do acesso à cultura, que asseguram o bem-estar social a população‘’, explicou Cesira Papera.
A forte influência italiana no Vale do Paraíba possibilitou que a região crescesse e desenvolvesse sem deixar suas raízes para trás. O Vale, não deve se esquecer das memórias daqueles que o fizeram ser o que é hoje, e que o legado deixado por eles, o fará ser amanhã. Grazie agli italiani! (Obrigado aos italianos!).
Por João Lucas Batista.
Foto: Reprodução/ QuiririmNews e PMTaubaté.